Mães que venceram a covid-19 encontraram forças e renovam a esperança com o nascimento dos filhos. O fato de ver que os bebês nasceram saudáveis, sem o vírus, trouxe também um motivo para sorrir no meio dessa pandemia


Benita começou a sentir os sintomas de covid-19 no sétimo mês de gravidez(foto: Arquivo Pessoal)
Benita começou a sentir os sintomas de covid-19 no sétimo mês de gravidez(foto: Arquivo Pessoal)

Em meio a pandemia, o nascimento de uma criança representa também o sentimento de esperança para muitas mães que, além de ter enfrentado a ansiedade da gravidez, também se protegeram da covid-19. Entre as emoções da gestação, da insegurança em relação a doença, vem o alívio ao ouvir o choro na sala de parto e saber que o bebê está saudável. Essa foi a sensação de, aproximadamente, 49 gestantes que deram a luz na rede pública de saúde do Distrito Federal, durante os meses de março até a primeira quinzena de junho.

Com a pequena Olívia no colo, a artesã Benita de Oliveira Carneiro, de 32 anos, conta que, durante a gestação, o maior medo que ela teve foi de a neném nascer prematura. “Vi muitos casos de mãe tendo o bebê antes do tempo, e isso me preocupou bastante”, relata. A moradora do Guará foi diagnosticada com a doença. “Quando recebi o resultado, já estava recuperada. Comecei a sentir os sintomas no sétimo mês de gravidez e, apenas no oitavo, quando realizei um segundo exame, veio a confirmação do vírus”, explica.

Por estar agora em uma fase que não há mais transmissibilidade, Benita respira com mais alívio. “Agora é redobrar os cuidados para que ela não pegue”, pontua. Além de Benita, os outros três filhos também apresentaram sintomas leves da covid-19. Atualmente, todos estão bem e podem curtir a irmã que nasceu no último dia 2. Mãe e filha receberam alta do Hospital Regional da Asa Norte no último sábado.

A chegada de Maria Eduarda também foi celebrada com bastante alegria por Antônia Valneide Martins, 31. A dona de casa conta que o nascimento da filha foi o que deu força para a família que perderam quatro familiares pela doença. “A sensação é horrível. Saber o quanto cruel é esse vírus e ver pessoas próximas morrerem. A gente sempre acha que não vai acontecer com a gente, até que acontece”, relata.

Por ter pessoas próximas que testaram positivo, Antônia precisou fazer o exame para a detecção da covid-19. O resultado saiu no dia de ganhar a bebê, e, com o acompanhamento no Hospital Regional da Asa Norte (Hran) — unidade de referência para pacientes com o novo coronavírus — ela deu entrada na maternidade do hospital em 30 de maio. “Foi um baque saber que estava com a doença, nunca imaginei que ia pegar. Ainda bem que estava assintomática e que o parto foi tranquilo, natural e rápido. Confesso que foi um alívio saber que a bebê nasceu bem. O meu medo era de não poder ficar com ela”, explica.


Mudança na rotina

Além dela, o marido, Hélio Lourenço de Brito, 42, e, os dois filhos, de 6 e 9 anos, tiveram o diagnóstico do novo coronavírus. No entanto, todos estavam assintomáticos. O maior desafio foi controlar a vontade de beijar e abraçar a bebê nos primeiros 14 dias. “A orientação passada pela equipe médica foi de evitar ter um contato mais próximo com a neném nesse período de quarentena. É ruim não poder cheirar, beijar, mas se é para o bem dela vale a pena”, pontuou.

A rotina também mudou. A hora da amamentação ganhou o álcool em gel e a máscara como aliados nos primeiros dias, tudo para evitar que a contaminação na recém-nascida. Mesmo após o período de distanciamento, Hélio conta que a família procura estar de máscara. “Buscamos esse cuidado e também adaptamos as comunicações com os familiares. Temos uma família muito grande e era comum, nos reunir, receber visitas. Agora só por videochamada e fotos nos grupos do WhatsApp”, pontua.

Referência no atendimento aos pacientes com a covid-19, o Hran também se destaca no acolhimento às gestantes que apresentam algum sintoma da doença. A maternidade está voltada para essas mães e oferta todo o amparo necessário para resguardar a saúde da grávida e do bebê. Porém, a estadia na unidade nem sempre gera uma sensação de alívio.

Para Tamara Regina Pacífico Silva, 26, a descoberta dos sintomas do novo coronavírus e a internação no Hran trouxe aflição na última semana. Mesmo sendo bem acolhida e atendida pelos profissionais da saúde, que fazem o acompanhamento das gestantes, ela relata que a limitação de não receber a visita do esposo, em um momento delicado como esse, pesa bastante. “Na terça-feira, quando eu fui internada, o meu marido estava trabalhando. Nem dei um abraço nele nem me despedi. Todos os dias ele me pergunta se estou melhor e quando volto para casa. Mas não sei”, comenta.

Um dos momentos mais difíceis para ela, foi quando descobriu o sexo do bebê e não pode dizer ao marido. “Eu tinha planejado tudo para descobrir e fazer uma surpresa para meu esposo. Queria muito ter contado pessoalmente, mas como não posso receber ninguém, fiz uma ligação e contei para ele. Às vezes me dá um vazio”, conta ela que será mãe de mais um menino, o nome já foi escolhido: Bryan.

Tamara, tem também um filho de 8 anos, o Arthur, está na expectativa da chegada de Bryan, que está na 19ª semana. Em relação aos receios, ela afirma que tem medo do desconhecido, de não saber o que vai acontecer, mas sempre que ouve o coração do filho batendo, forte e saudável, ela se acalma.

Ela foi internada após apresentar os sintomas de perda de olfato e paladar, além de sentir muita dor. Chegou a fazer uma tomografia que apresentou alteração no pulmão. Pela suspeita da covid-19, precisou ficar no hospital até o resultado do exame. No último sábado, veio a boa notícia. Ela recebeu alta e pode dar continuidade no isolamento, em casa.

Pesquisa

Além do Hran, o Hospital Universitário de Brasília (HUB-UnB) também está ofertando acompanhamento para as gestantes que tiveram covid-19 e não estão mais na fase ativa da doença. O programa oferecido pela unidade faz parte de um projeto de pesquisa que visa analisar os efeitos do vírus durante a gestação, no parto, pós-parto e no desenvolvimento da criança.

De acordo com a chefe da Unidade Materno-Infantil do HUB, e uma das coordenadoras da pesquisa, Lizandra Paravidine, esse estudo é importante para entender o impacto que a doença tem na vida dessas mães e crianças. “Sabemos que esse vírus afeta o sistema neurológico, como na aparição de sintomas da perda de olfato, perda do paladar, dor de cabeça. Queremos saber se essas questões também vão ter impacto para o desenvolvimento do bebê”, pontua.

Além disso, as mães recebem amparo de uma equipe multiprofissional com psicólogos, médicos, pediatras. O objetivo é acompanhar cerca de 300 gestantes para avaliar, por exemplo, se a covid-19 aumenta o risco de abortamento, parto prematuro, pré-eclâmpsia e malformação fetal. “Estamos preparados para atender as gestantes e os recém-nascidos”, ressalta Lizandra.

Até a última quarta-feira, 11 mães tiveram o primeiro atendimento pelo projeto. Entre elas, está a Andreia de Paula Rodrigues Brito, 34. A servidora pública conta que está feliz por poder ajudar nessa pesquisa. “Estou supercontente. Eu me senti útil por saber que posso contribuir para ajudar outras mães”, afirma ela, que está no sétimo mês de gestação.

Andreia conta que descobriu a doença quando estava na 20ª semana da gravidez. “Inicialmente foi um choque. É um vírus novo, nem os médicos sabem ao certo. A minha maior preocupação foi com o bebê, se ele estaria bem. Fiquei com medo de um aborto, porque eu não estava assintomática. Senti muito cansaço físico, febre, tive muita tosse. Veio a preocupação”, relata ela. “Como eu poderia ter o neném com a falta de ar? E se faltar a UTI? O meu estado emocional foi lá embaixo. Agora estou mais tranquila, estou bem mais preparada, e contei muito com a ajuda dos profissionais do posto de saúde nº 8 de Taguatinga. Fui bem amparada”, destaca.

Diante do novo cenário de pandemia, com as orientações de isolamento social, sem muito contato físico, higienização sempre que for necessário e o uso de máscara. Ela e os três filhos estão se adaptando à nova rotina dentro de casa. “O meu filho pequeno, de 5 anos, sofreu bastante quando eu estava em quarentena”, lembra.

Sobre o atendimento no HUB, ela conta que está gostando bastante. Andreia se sente mais calma para ter o bebê. “Sei que estarei bem amparada. E, para a mãe que está passando pela mesma situação, a minha dica é: procure apoio. Aqui em Brasília tem uma rede muito boa. O SUS é excelente, não deixe de fazer o pré-natal e se cuide”, pontua.

A pós-doutora em psicologia perinatal do Hospital Materno Infantil Alessandra Arrais, explica que o acompanhamento das mães nesse período de gestação é muito importante. “Eu costumo dizer que, além do acompanhamento da saúde do bebê, é preciso ter um pré-natal psicológico também. Cuidar da saúde mental delas, principalmente nesse período que estamos passando”, ressalta.

A pesquisa

Para ser atendida no projeto de acompanhamento do Hospital Universitário de Brasília, a gestante deve entrar em contato pelo telefone 2028-5232. É preciso ter o diagnóstico confirmado de covid-19 há pelo menos 14 dias e atender a alguns critérios, como ter 18 anos, ou mais, e não ter suspeita ou confirmação de outras infecções congênitas ou doenças crônicas preexistentes, exceto diabetes e hipertensão.