Assistentes de parto oferecem suporte emocional e encorajamento para mulheres
Do Estadão
Janaina Lacerda é doula há seis anos na cidade de Jacareí, no interior de São Paulo, e também já acompanhou alguns partos durante a pandemia. “Foi uma experiência peculiar. É estranho para nós que transitamos no cenário do parto com certa naturalidade, ter equipamentos de proteção, preocupação com toques, proximidade. As acompanhei durante o trabalho de parto em casa dando o suporte necessário para que elas se sentissem seguras, confortáveis e fossem para o hospital em momento oportuno”, conta.
Na maternidade de Jacareí, a orientação é que a gestante tem garantia de um acompanhante de sua livre escolha, segundo a Lei Federal nº 11.108. “Antes da pandemia, elas podiam ter o acompanhante e a presença da doula durante todo o período do trabalho de parto. Porém, a pandemia nos trouxe essa limitação e, então, algumas gestantes optaram que eu entrasse para auxiliá-las. É uma decisão difícil, mas são escolhas necessárias nos dias atuais e que buscamos trabalhar com antecedência para não trazer ainda mais insegurança no momento do parto”, avalia Janaina.
Paulina também observa o sofrimento das gestantes por ter de abrir mão da doula na hora do nascimento do bebê. “Está sendo bem desafiador adaptar meu trabalho para essa nova realidade. Tem muito lugar no Brasil que proibiu a entrada das doulas. Aqui em São Paulo tem alguns lugares e isso está sendo um conflito para estas gestantes que estavam achando que a doula estaria com certeza no dia do parto”, desabafa.
Na cidade de Jundiaí, também no interior paulista, Izabel Medeiros auxilia partos há pouco mais de dois anos. Em tempos de coronavírus, ela participou de alguns procedimentos, incluindo um domiciliar. “Todos tiveram em comum um pouco mais de tensão, mesmo com todos os cuidados e EPIs, parturiente, acompanhante e equipe estavam um pouco mais apreensivos”, relata.
A doula também teve de adaptar o trabalho pré-natal com as gestantes, que é feito presencialmente, para o universo virtual. “Os encontros pré-parto passaram a ser online, assim como os de pós-parto”, diz.
Para as gestantes, Izabel aconselha: “Viva o presente. Permita sentir suas emoções e sensações, sejam elas positivas ou negativas, trazendo à consciência o que está sentindo e buscando caminhos para que os dias passem com mais tranquilidade. Trazer o acompanhante para perto, incluí-lo no processo é de suma importância para um parto mais tranquilo. E também preparar-se para o pós-parto, já que nem sempre poderemos contar com ajuda extra”, conclui.
Parto domiciliar na quarentena: uma possibilidade que precisa de cuidado e planejamento
Aos 38 anos de idade e na terceira gestação, Giovanna Balogh já havia decidido realizar o parto domiciliar muito antes da pandemia do novo coronavírus. “Tive dois partos normais. Sou mãe do Bento, que tem 10 anos, e de Vicente, de oito. Os dois foram hospitalares. E eu sempre dizia que, se eu engravidasse de novo, queria que fosse em casa”, lembra.
Ela e a família vivem no município de Mogi das Cruzes, em São Paulo. Durante a gestação, todos tomaram os cuidados necessários e estão isolados em casa desde o dia 15 de março. O marido, que é fotógrafo freelancer, recusou diversos trabalhos para não colocar a família em risco.
Sem plano de saúde, a opção de hospital seria a Santa Casa da região. “Era nosso ‘plano b’, se tivesse alguma intercorrência. Tenho uma médica particular, que atende pela Santa Casa, que seria nossa médica backup. Se precisasse de uma analgesia ou se algo não transcorresse como planejado, a gente iria para lá. Só que diante da pandemia, queria menos ainda ir para o hospital. Também porque estavam restringindo acompanhante, as parteiras não poderiam entrar e era uma coisa que não queria passar de jeito nenhum”, afirma.
Giovanna contou com duas enfermeiras obstetras – todas equipadas com EPIs -, o marido e os dois filhos. “A gente conversou bastante com eles sobre a mamãe gritar, ficar fora de si durante o trabalho de parto. Eles entenderam, mas optaram em não ficar presentes na cena. Eles passavam na porta do quarto, davam uma espiada e só depois que ela nasceu que eles quiseram ver”, diz.
A pequena Teresa nasceu no quarto dela, pesando 3,2 quilos e medindo 51 centímetros, em uma piscina levada pelas enfermeiras que deram assistência. “Foi a experiência mais incrível da minha vida! Nem parece que vivi tudo isso aqui. E, assim que ela nasceu, meu marido a pegou no colo. Ela ficou o tempo todo comigo, veio pra cama, olha, foi uma experiência muito gostosa. Só lamento as pessoas mais próximas não poderem vir visitar, as avós e os avôs”, desabafa.
Emocionada, Giovanna chora ao contar que havia planejado passar o puerpério ao lado da mãe, no momento mais frágil da mulher após o nascimento do bebê. “Eu idealizava muito a minha mãe estar comigo, ajudando a arrumar o enxoval. Eu idealizava ter um chá de benção com minhas amigas, receber o carinho na reta final e não rolou. Fazer o quartinho com a minha mãe. E deixamos tudo isso para depois. A gente deixa para depois porque você vê que é supérfluo e que dá para deixar para depois. Sofro muito de ver o tempo passar e minha mãe não poder pegar minha filha no colo. Eu choro, me emociono. Fico torcendo para o povo se conscientizar e essa fase passar logo, as pessoas ficarem em casa para a gente poder ter, enfim, uma vida mais normal”, conclui.
Dicas de segurança para gestantes no parto em tempos de pandemia
O governo federal não tem dados sobre o número de partos, planejados ou acidentais, em domicílio. Mas grupos de parteiras ouvidos pela reportagem relatam que a procura por esse tipo de procedimento têm aumentado durante a pandemia.
No entanto, o parto em casa só é elegível em casos de gestações em que o risco é habitual, em que a mulher ou o bebê não tenham doença prévia e o pré-natal ocorra sem complicações. “Em primeiro lugar, é preciso ter a certeza de que a escolha de parto domiciliar não deve ser pautada no medo do coronavírus, senão, não é o mais indicado. Caso não seja isso, procure uma equipe que tenha vasta experiência no atendimento a partos domiciliares”, aconselha a enfermeira obstetra da Unifesp Cinthia Calsinski.
O site do Ministério da Saúde tem um documento, de 2010, com normas e procedimentos relacionados ao parto domiciliar, com recomendações para as parteiras.
Em tempos de coronavírus e em ambiente hospitalar, Cinthia Calsinski lembra que as visitas estão proibidas. “A providência mais acertada é de conversar com o obstetra para que receba alta o mais precocemente possível. O alojamento conjunto é ainda mais indicado neste momento, para que se evite exposição desnecessária do recém-nascido aos profissionais de saúde para realizar cuidados que podem perfeitamente ser feito pelos pais”, ressalta a especialista da Unifesp.
De acordo com o Ministério da Saúde, em Nota Técnica, é necessário a “realização de uma triagem em toda parturiente e seu acompanhante para casos suspeitos ou confirmados da covid-19 antes da sua admissão no serviço obstétrico, como também apresenta as situações e condições necessárias para permissão da participação do acompanhante”. O documento ainda informa que todas as visitas devem ser, temporariamente, suspensas, visando a proteção de todos.