A cesariana forçada ou indicada sob falsos pretextos é uma das formas de violência obstétrica, caracterizando não apenas medicalização excessiva do parto mas apropriação do corpo feminino no processo reprodutivo. Portanto, é importante saber em que situações há uma real indicação de cesariana para que as mulheres tenham pleno acesso à informação e possam participar do processo de tomada de decisão:
DEZ INDICAÇÕES REAIS DE CESARIANA
1) Prolapso de cordão – com dilatação não completa: é raro e muitas vezes iatrogênico, quando ocorre depois da ruptura artificial da bolsa das águas (amniotomia), mas se acontecer fora do período expulsivo é uma real indicação de cesariana, além de outras manobras que são realizadas para elevar a apresentação até a extração fetal.
2) Apresentação córmica (situação transversa): ocorre em menos de 1% das gestações e durante o trabalho de parto é indicação de cesariana. Como prevenção, antes pode ser tentada a versão cefálica externa.
3) Placenta prévia parcial ou total (total ou centro-parcial): o nascimento espontâneo é impossível sem exsanguinar a mãe, pois a placenta está à frente da apresentação fetal. Notar que o diagnóstico definitivo só é possível no terceiro trimestre. Placentas de inserção baixa ou marginal são compatíveis com o parto vaginal, monitorando-se o sangramento.
4) Desproporção cefalopélvica (DCP): o diagnóstico só é possível intraparto e não pode ser antecipado durante a gravidez. Em 1934 um obstetra (Barbour) já dizia que “o melhor pelvímetro é a cabeça fetal”, e é avaliando a progressão da cabeça fetal através do canal de parto na presença de contrações eficientes que pode ser aventada a suspeita de DCP. Ou seja, só é possível na fase ativa do trabalho de parto depois de várias horas. Não há nenhum método capaz de predizer DCP antes do trabalho de parto, como pelvimetria clínica ou Raios-X, tamanho do pé etc.
5) Sofrimento fetal agudo (o termo mais correto atualmente é “frequência cardíaca fetal não-tranquilizadora”, exatamente para evitar diagnósticos equivocados baseados tão-somente em padrões anômalos de freqüência cardíaca fetal); as diretrizes atualizadas da FIGO sobre monitorização fetal intraparto podem ser consultadas por quem deseja se aprofundar sobre o assunto. De acordo com a OMS, ausculta fetal intermitente (com sonar por exemplo) deve ser realizada durante o trabalho de parto nas gestações de baixo risco a cada 30 minutos e nas gestações de alto risco a cada 15 minutos. Há indicações específicas de monitorização contínua. Padrões desfavoráveis de frequência cardíaca fetal durante o trabalho de parto requerem medidas de ressuscitação intrauterina e cesariana. No período expulsivo a antecipação do parto será pela via mais rápida, o que pode significar parto instrumental com fórceps ou vácuo.
6) Descolamento prematuro da placenta com feto vivo – fora do período expulsivo. Pode acontecer em decorrência de síndromes hipertensivas (80%), trauma (10-15%) ou não ter uma causa definida. A cesariana deve ser imediatamente realizada para salvar o bebê pois quanto maior a área de descolamento maior o risco de óbito fetal. Também há risco de hemorragia materna e suas complicações.
7) Ruptura de vasa praevia e inserção velamentosa do cordão: se houver diagnóstico pré-natal de inserção velamentosa do cordão deve-se agendar cesariana eletiva pois quando a bolsa se rompe o sangramento dos vasos prévios pode rapidamente exsanguinar o feto. Durante o trabalho de parto o diagnóstico é presumido quando há sangramento sem aumento do tono uterino e com alterações da frequência cardíaca fetal.
8)  Herpes genital com lesão ATIVA no momento em que se inicia o trabalho de parto (em algumas diretrizes, somente se for a primoinfecção herpética). A profilaxia a partir de 36 semanas com aciclovir é recomendada para reduzir o risco de lesão herpética durante o trabalho de parto nas gestantes com história de herpes genital.
9) Parada de progressão que não resolve com as medidas habituais (correção da hipoatividade uterina, amniotomia): recentemente tanto autores como diretrizes concordam que os critérios devem ser mais elásticos. O próprio uso de ocitocina e a amniotomia não têm efetividade comprovada quando comparados com a conduta expectante; recomendamos consultar as diretrizes da OMS sobre condução do trabalho de parto. O uso do partograma de Friedman é altamente questionável. A evolução do trabalho de parto tem grande variação, recomendando-se atualmente considerar como parâmetro outras curvas, como as curvas de Zhang (2010) descrevendo a evolução normal do trabalho de parto em percentis, considerando a paridade. O partograma deve ser preenchido sem linhas de alerta e de ação, conforme recomendação da OMS.
10) Antecedente de cesariana corporal, ruptura uterina ou miometrectomia (cirurgia para retirada de miomas em que houve perda considerável de milimétrio). Antecedente de uma ou mais cesarianas com incisão segmentar não representam per se indicação de cesariana e o processo de tomada de decisão deve ser individualizado pois as mulheres devem ser informadas sobre os riscos de uma prova de trabalho de parto, incluindo ruptura uterina (0,5% depois de uma cesárea) contra os riscos de se repetir uma cesárea, tanto imediatos como tardios, incluindo hemorragia, infecção, lesão vesical e outros. Várias diretrizes ENCORAJAM a prova de trabalho de parto na presença de cesárea anterior. Se a incisão é desconhecida uma prova de trabalho de parto também pode ser recomendada.
Texto: Melania Amorim
Realização: ReHuNa
Apoio: ECOS UnB e Rádio Web Saúde UnB
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